Cavando Ideias – Visita a Ana Mae Barbosa
Cavando Ideias – Visita a Ana Mae Barbosa é artigo de Silvia Ferreira Lima.
Já que comecei a escrever sobre educação, não teria como não citar um momento que seria comum: a visita para uma antiga professora do meu marido, atual livre docente em Artes e Professor do Departamento de Artes na Unicamp: Edson do Prado Pfutzenreuter. Acho importante contextualizar, porque o Edson fez questão de visitar sua antiga professora de graduação, uma vez que ela, toda vez que se encontram, o trata com muito carinho e o chama de queridinho da professora.
Pessoalmente, ela nos disse que o Edson era o tipo de aluno cujas perguntas a faziam pensar, visto que levavam a ideias às quais ela mesma ainda não tinha chegado. Foi um grande prazer esta visita. Afinal, não é todo dia em que se vai visitar uma professora internacionalmente conhecida como a grande valorizadora do ensino de Arte no Brasil. Sua proposta triangular ainda não foi superada, uma vez que, ensinando os elementos visuais e sua contextualização, o aluno torna-se capaz de ler as imagens do mundo em si. Para ela, a leitura da obra de arte é uma interpretação e suas interpretações podem ser diversas.
Fomos até sua casa, com uma colega da Unicamp que ensina Arte e Educação, que foi sua orientanda de Doutorado na ECA. Então, eu também pude saber o quanto Ana Mae era sensível e gentil. Sempre tratou seus orientandos como filhos, e pedia que os mais adaptados à Instituição ajudassem os que estavam entrando recentemente.
Bom, a sala de Ana Mae tem obras de arte muito conhecidas e respeitadas, como uma gravura de Aldir Botelho e Marcello Grassmann, entre outros. A própria sala em si é uma galeria de arte. Além dos livros, empilhados em várias prateleiras. Lembrei das vezes em que visitei Haroldo de Campos, praticamente um vizinho de Ana Mae, cujas paredes estavam todas preenchidas de prateleiras de livros. Inclusive foram amigos e vizinhos, em Perdizes, São Paulo. Justamente onde fomos para visitá-la.
Adorei quando contou sua história: como foi alfabetizada em casa pela avó, aliás, foi criada pela avó, uma vez que seus pais eram mortos. Quando criança, morria de vontade de ir à escola. Chegou a frequentar uma escola de freiras, porém sentiu-se feliz ao estudar na escola pública em Maceió. Porém, Ana Mae nasceu no Recife, para onde voltou a fim de fazer o curso de Direito. Formou-se em Direito, que segundo seu conterrâneo e amigo, Paulo Freire, era um bom curso para auxiliá-la em várias questões da vida. Ana Mae, acabou estudando Arte e dando aulas em algumas pequenas escolas de Arte. Fazendo experiências para criar seu trabalho de pesquisa. Ela confessou que a História da Arte assim como os Procedimentos sempre foram duas áreas que a encantaram. Disse que talvez leve adiante um estudo Histórico.
Suas propostas de ensino da arte sempre foram democráticas, com o desejo de oferecer aos alunos todas as técnicas, habilidades e tipo de arte existentes, para o aluno poder escolher com qual se identificaria. Sua proposta triangular é uma relação crítica em que o aluno teria, mediada pelo professor, com o conhecimento do mundo visual. O aluno também recebia uma aplicação prático-pedagógica do ensino da arte; podendo experimentar releituras das obras de arte que ele observava.
Bom, tratar da didática da arte, bem como de suas teorias, não é minha especialidade, por isso, posso estar cometendo alguns equívocos no que estou escrevendo. Mas que considero importantíssimo o trabalho da arte, principalmente, para autoterapia daquele que utiliza suas técnicas para se expressar e autoconhecer. Sei como eu me sinto fazendo arte com os instrumentos e formas com as quais eu me identifico. E que se forem analisadas podem auxiliar na explicação do porquê cada sujeito possui determinadas atitudes. Aliás, o próprio Karl Gustav Jung chega à conclusão de que a arte é terapêutica. E nossa Nise da Silveira descobriu como tratar os esquizofrênicos com trabalhos de arte. Estes exemplos já deveriam ser fortes o suficiente para justificar a necessidade da arte nas escolas.
Começamos a conversar sobre as novas gerações e eu comentei o quanto acredito nas novas gerações, que estão sempre nos ensinando como viver na atualidade. Além de outros comportamentos e aceitações sociais, que eu me lembro, não terem sido tão valorizadas ou trabalhadas, quando eu estava na infância. Neste momento, a fé nas novas gerações foi comum. Ana Mae, comentou um momento na sua vida com o falecido marido João Alexandre Barbosa, quando toda a equipe de professores da Universidade de Brasília pediram demissão para fazerem uma reinvindicação e acabaram contratando novo corpo docente. Ela comentou que as novas gerações não são tão ingênuas a este ponto.
Ana Mae Barbosa também comentou como vê o trabalho de todas as manifestações artísticas de forma integrada. E eu comentei a movimentação dos alunos de cênicas, visuais, dança e música, na Unicamp, defendendo melhores condições das salas de aula e valorização da Arte do mesmo modo como a ciência deve ser valorizada.
Adorei conhecê-la pessoalmente. Pude também ouvi-la dizer que já brigou bastante, quando começou a dar aulas na USP e estava em início de carreira por lá. Mas que atualmente ela evita discutir ou brigar, uma vez que o tempo já lhe fez perceber que muitas das discussões que se abarca resultam em perda de tempo.
Gostei de conhecer seu sofá, onde os orientandos se sentam para serem analisados rs. Na verdade, ouvi que sempre foi difícil não falar a verdade para Ana Mae, que sempre demonstrou carinho, compreensão e apoio a seus orientandos. Sou que pelo menos uma vez por ano, os atuais e os ex-orientandos se encontram para comemorar o aniversário de Ana Mae. Deste modo, todos se conhecem e continuam fazendo novos grupos de apoio ou de trabalho.
Jurema já aproveitou a visita para falar para Ana Mae que gostaria de recuperar seu trabalho escrito em diversas revistas para uma pesquisa de pós-doc. Bom, eu que saí de uma área para outra, embora ambas possam ser relacionadas e não fui/sou só eu que faço isso. Fiquei surpresa, positivamente, ao conhecer uma pesquisadora que se aprofundou em arte-educação, de forma a tornar uma simples conversa, como uma aula.
Bom, pessoalmente, eu saí ganhando. No mínimo, com a curiosidade aguçada para saber ou ler mais a respeito. Há certas pessoas que são uma lição de vida, em qualquer momento. Agradeço aqui a carinhosa recepção e as sábias palavras, que devem ser valorizadas a qualquer momento. O assunto educação ainda continua…