As águas de março e de mágoas
O mês de março chegou
Verão acabando,
E os beija-flores se lambuzando e se fartando nas flores do Hibisco
O outono já anunciando no
Turbilhão das águas de março
Que as folhas secas serão carregadas em sua enxurrada
Toda tarde tem
Trovões e Raios, um prenúncio de temporal
Um temporal que toma conta da nossa vida
É mês de março
As mulheres
Negras, indígenas, brancas, amarelas
As que são oprimidas e comprimidas
Partilham suas histórias, suas lutas
Na promessa de que a resistência
Nos trará uma primavera de bons sonhos para o planeta
É mês de março
E com ele chegou uma onda de dor e pavor
Os números!
São números, registros, estatísticas,
Dos meus e dos seus
Todos nossos amores
Que se despedem compulsoriamente
Dos seus planos, dos seus sonhos,
Dos seus filhos, de seus pais, de suas companheiras, companheiros e
Dos amigos,
Sem que possam ter trocado um, um só olhar de adeus
É mês de março
Um mês quase eterno
Não termina
É o mês do fim
Fim dos leitos,
Fim dos hospitais
Fim do Oxigênio
Fim dos remédios
Fim!
Fim dos homens de caráter, humanos e de coração solidário
É mês de março
Início do outono e
Apesar das suas águas
A mágoa da folha seca
Marcada nos estômagos secos
A mágoa das perdas
Estirada num pedaço que não se junta
As vidas vazias
Um silêncio,
Silêncios de luto
Não fazem nada pelo nosso luto
Ficamos num luto sem fim,
Que é luto de toques, meu e de muitos
A lista?
Não fecha, sempre aberta
A vida é um obituário
Um lugar vazio na mesa
Um lugar vazio na cama
Silêncio!
O único barulho é o da chuva despejando suas águas e mágoas de março
Chorando a dor do
Silêncio!
E os beija-flores se multiplicando em voos, num frenesi pelas últimas flores do Hibisco
Ainda em Flor
Poesia escrita por Evinha Eugênia.
Gravação em áudio: Zuca Fonseca
Fonte: Expresso Periférico