Cavando ideias • Sobremesa um ritual cultural

Cavando ideias • Sobremesa um ritual cultural

Cavando ideias • Sobremesa um ritual cultural é artigo de Silvia Ferreira Lima em sua coluna semanal na Expedição CoMMúsica.

 

Natascha de Cortillas Diego artista chilena em visita à Unicamp
Natascha de Cortillas Diego, artista chilena em visita à Unicamp

 

Quando trato de um ritual cultural, falo da experiência de arte contemporânea da artista chilena convidada pelo departamento do Instituto de Artes da Unicamp para conversar com os alunos da graduação e demais público interessados sobre suas experiências e até vivê-las conjuntamente. O que para todos os envolvidos foi um momento de extremo prazer, solidariedade, respeito aos antepassados e aceitação intercultural. Infelizmente, não pude participar de todos os momentos intensos de convivência e expressão dessa artista chilena excepcional e, principalmente, excelente ser humano: sensível, bem humorada e super disposta a ter esses momentos de troca com todos os interessados. O primeiro contato que tive foi um anúncio da Profª Drª Sylvia Furegatti com a divulgação do cartaz acima e a notícia que passou para seus amigos, conhecidos e interessados em participar desses momentos.

“Estimados colegas, a artista visual e professora chilena Natascha de Cortillas estará no Instituto de Artes da Unicamp a partir da próxima semana e apenas por quinze dias para realizar uma residência artística com todos os interessados. Trata-se de uma bolsa Unicamp-Santander organizada pela Proec/DCult. Assim, eu os/as convido e solicito que divulguem  também. Na segunda, dia 12, período da tarde, Natascha fará uma palestra aberta sobre sua produção e as perspectivas possíveis de participação dos interessados. Espero que possam participar! Abs!”

Nessas palavras da professora Sylvia, já se observa como a artista chilena pode vir ao Instituto de Artes da Unicamp e oferecer uma residência artística de 15 dias. Claro que qualquer artista em boas condições toparia em se inscrever para este edital. Sorte a do Instituto ter sido a vez da Natascha ser escolhida. Não pude comparecer à palestra na Unicamp. Quando comentou sobre o início de sua experiência de amassar o pão, como ato de performance que se relacionava à resistência política chilena com relação às medidas econômicas do governo e como este ato era principalmente composto por mulheres. Daí, veio a ideia de preparar uma refeição coletiva. Dias em que escolheria os ingredientes, como o fez numa visita a um espaço de venda de produtos do MST no bairro do Guanabara em Campinas. Nesta visita, sábado pela manhã, nós nos conhecemos e também paramos para comprar alguns produtos.

Então, combinamos uma noite de pizza com a família da professora Sylvia Furegatti e a minha família que, nestas horas, tenho o privilégio de ser parte da família do Prof. Edson Pfutzenreuter, seu amigo e colega de trabalho e meu companheiro, mais minha filha, que é fluente em espanhol. Ocasião em que descobri que Natascha tinha ficado fluente em português, numa residência efetuada na Europa há mais de dez anos. Segundo ela, quando começou a falar português, não parou mais rss. E foi bem simpática em suas atitudes. Na ocasião, ela escolheu legumes, verduras, temperos, de produção nacional e local. Para realizar seu banquete. Depois eu observei que também comprou bastante alho e cebola.

Na quarta-feira seguinte, dia 21 de setembro, passaram a tarde, a partir das 16 horas, Natascha e alguns alunos e alunas de 2019, pelo menos a maioria tinha entrado neste ano, no espaço teatral do Lume, um grupo teatral mundialmente premiado, cuja professora Cristina, uma das integrantes, participa do grupo de pós-graduação em Artes Cênicas da Unicamp como associada. Ela também recebeu a todos muito bem. E claro que também conversamos sobre teatro. Creio que só faltaram alunos de dança e música para conversarmos sobre isso. Se bem que um dos meninos da Professora Sylvia, pulava, virava estrelas e dava cambalhotas como um mestre yogui. Sinceramente, fiquei encantada com a flexibilidade e agilidade da criança. Sem contar com a conversa. Muito esperto, carinhoso e conversador.

Cada um, por sua vez, ou levou algum prato de casa, ou trouxe alguma coisa cuja origem viesse de suas terras ou de sua família. A Natascha nos trouxe do Chile uma alga crua que ficou deliciosa picada na salada com cebola, vegetais, cenoura, pimenta vermelha, milho. Sem mencionar que serviu de antepasto a panquecas de bananas verdes que um dos rapazes da Colômbia fez na hora, amassando as bananas. Sentimos vontade de nos aproximarmos dos sabores do Pacífico. E aí se falou sobre os sabores dos outros países do mundo. Como um arroz com lentilhas que não tinha somente lentilhas, mas alguns legumes a mais que um dos rapazes, de Minas Gerais, disse que aprendeu com a mãe, que aprendeu com a avó, e a cada geração eles acrescentavam mais um ingrediente.

Levamos alguns pães caseiros feitos em casa, principalmente durante a pandemia, quando não saíamos nem para ia à padaria. E com certeza não faltaram umas seis garrafas de vinhos chilenos em temperatura ambiente. Sem mencionar a tradicional caipirinha brasileira, feita com bastante limão, açúcar e cachaça. Então, Natascha presenteou cada um com um boton em que se lia ‘sobremesa’. O que significa estritamente, colocar acima da mesa.  Conversou-se bastante sobre etimologias linguísticas, devidas a mesma origem entre o espanhol e o português, embora, cá entre nós, o português seja uma língua mais distanciada da origem latina, talvez devido à mais forte influência fenícia, talvez devido às Influências das raças originais brasileiras: indígenas, africanas, árabes entre outras.

Comentamos até mesmo de alface ser chamado lettuce em espanhol , em francês e em inglês, porém ser chamado de alface aqui no Brasil. O que se sabe é que as palavras que possuem um AL na frente são na sua maioria de origem árabe.

Continua aqui a questão do que vem a ser arte contemporânea? Na minha opinião, é uma bonita forma de expressão que transmite uma ideia, uma emoção que deseja passar ao observador, ou ainda, envolver o observador na sua manifestação. Entretanto, mais do que tudo, foi um retorno aos primórdios da origem humana, em que se valorizava a alimentação, o momento de troca de experiências de vida enquanto se alimentava de energia, de saberes, de comidas, de emoções. Foi tudo lindo! Valeu a pena!!!

 

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