O Prêmio Camões vai para Paulina Chiziane: escritora, mulher e negra
Quando uma mulher publica um livro, uma fada nasce… Assim acredito, dado o esforço e toda a abnegação necessária! Mas se lançar na literatura é apenas parte de uma jornada. É preciso fazer a obra chegar ao público, ter reconhecimento, encarar a crítica, entre tantas muralhas que tornam essa luta ainda mais árdua. Se a mulher for negra, os obstáculos são ainda maiores.
No dia 20/10/2021, entretanto, a moçambicana Paulina Chiziane, ao ter a sua obra distinguida pelo Prêmio Camões de Literatura 2021, fez todas as mulheres escritoras se sentirem de algum jeito contempladas. Afinal, o prêmio é dela, mas representa um reconhecimento para todas nós. As mulheres não costumam ser muito lembradas em premiações literárias e, quando isso acontece, devemos celebrar.
Literatura Africana em Língua Portuguesa:
Para se ter uma ideia, foi a primeira vez que uma mulher africana recebeu esse prêmio, mesmo havendo seis países desse continente tendo Português como língua oficial: Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Guiné Equatorial. O Prêmio Camões de Literatura foi instituído em 1988, e até hoje já foram laureadas apenas seis mulheres, duas brasileiras e quatro portuguesas, todas brancas. Conforme a organização, o objetivo é “consagrar um autor de língua portuguesa que, pelo conjunto de sua obra, tenha contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário e cultural de nossa língua comum.”
Mulheres contempladas em grandes premiações:
Em âmbito mundial, a premiação de maior destaque para os escritores é o Prêmio Nobel de Literatura. Seguindo uma linha misógina e eurocêntrica, em 120 anos de existência, o Nobel agraciou somente quinze escritoras mulheres – uma única mulher latina, nunca uma brasileira, apenas uma mulher negra e somente uma autora do continente africano.
No Brasil, o prêmio mais aguardado do ano é o Jabuti, que desde 1991 elege uma obra como “Livro do Ano” e já contemplou quinze vencedoras ao longo de trinta anos de existência da premiação, uma equidade rara no meio literário. Em 2020, o Prêmio Jabuti elegeu “Solo para Vialejo”, de Cida Pedrosa, como vencedor nessa categoria. Ainda não foram divulgados os finalistas da edição de 2021.
Representatividade:
Ainda lutamos para estar em todos os espaços. Uma outra conquista recente na seara da literatura foi a eleição de Fernanda Montenegro como imortal da Academia Brasileira de Letras, representando a cadeira número 17 e, a partir de 4 de novembro, será a nona mulher a tomar posse. Fundada em 1897, a ABL vem de um histórico altamente patriarcal, não tendo aceitado escritoras entre seus membros até 1977 com o ingresso de Rachel de Queiroz.
Quem é Paulina Chiziane?
A autora nasceu em 1955, em Manjakaze, Moçambique, atuou como militante política na juventude, começou a escrever em 1984 e foi a primeira mulher a publicar um romance em seu país, ao lançar “Balada de Amor”. Sua escrita se destaca por tratar de assuntos polêmicos, principalmente a poligamia. Em 2016, encerrou suas atividades como escritora.
Ao saber do prêmio, a autora com 66 anos, manifestou-se dizendo: “Meu Deus! Eu já não contava com essas coisas bonitas! É muito bom. Esse prêmio é resultado de muita luta. Não foi fácil começar a publicar sendo mulher e negra. Depois de tantas lutas, quando achei que já estava tudo acabado, vem esse prêmio. O que eu posso dizer? É uma grande alegria.”
A alegria é de todas nós, Paulina!
No Brasil, você pode encontrar as seguintes obras de Paulina Chiziane:
- “O Alegre Canto da Perdiz” (1988), pela Editora Dublinense: O livro trata de uma denúncia das condições precárias em que vivem as moçambicanas negras.
- “Niketche, Uma História de Poligamia” (2021), pela Editora Companhia das Letras: Conta a história de uma personagem que descobre a poligamia de seu marido e vai em busca de suas outras mulheres.
Muito importante divulgar a literatura de Mulheres