Rock Macumba: Casapronta lança carreira solo com álbum que exalta ritmos do candomblé e umbanda
Rock Macumba: Casapronta lança carreira solo e Álbum “SETE” protesta contra demonização da cultura e religiosidade afro-brasileira, através de influência rítmica das músicas de terreiro, misturada ao rock e ao blues.
O Rock Macumba de Casapronta estará na Rádio Tucana em breve, em playlist especial. O artista também está no Mapa da Expedição CoMMúsica.
São Paulo, 9 de abril de 2024 – Em uma mistura de rock, blues e influências da musicalidade afro-religiosa, o cantor e compositor Casapronta acaba de lançar seu primeiro álbum da carreira solo (no dia 7 de abril).O artista, que tem 26 anos de carreira, desponta na cena independente com seu estilo musical autointitulado “rock macumba”. O álbum “SETE”, número emblemático para o músico, simboliza um grito de protesto contra a demonização da cultura e religiosidade afro-brasileira, ao mesmo tempo que expressa liberdade e celebração às raízes ancestrais. O álbum já está disponível e pode ser ouvido aqui.
No disco SETE, Casapronta transmite suas experiências e observações acerca do universo do candomblé e umbanda, diluídas em poesia, acordes e atabaques. As músicas incluem vinhetas extraídas de áudios das festas de terreiro, dos Exus, de Zé Pilintra e Capa Preta. A irreverência, tão comum no rock’n’roll, também se faz presente no álbum com o som marcante das guitarras, além dos arranjos simples, diretos e crus.
>Clipe da música Reza: https://www.youtube.com/watch?v=zHyN2gesxQk
O álbum tem um conceito construído a partir de uma narrativa, organizada através da sequência das músicas, que se inicia com os Exus, um feminino (1.Dona Maria) e outro masculino (2.Capa Preta), seguidos de ritos e costumes (3.Mandinga e 4.Oferenda). A trilha segue com a reverência a uma deusa africana da cultura Bantu / Angola (5.Matamba) e destaca o Deus cristão sob um ponto de vista regional (6.Deus é o Cão). A última faixa apresenta uma reza, rodeada de ancestralidade, em forma de samba, que abraça todo o trabalho (7.Reza).
“Falar de deuses e deusas na perspectiva de uma afrobrasilidade é revolucionário. É enfrentamento, é bater de frente com o conservadorismo que nos espreita em cada esquina. Com o disco SETE abro as portas de meu terreiro musical e convido o público para mexer o caldeirão cultural, com o dendê fervendo, para queimar a língua dos racistas e nos deixar passar com o nosso Axé”, destaca o artista.
Cria do Recôncavo baiano, Casapronta é natural de Feira de Santana, foi criado em Cruz das Almas e morou também em Cachoeira, regiões que influenciaram sua trajetória artística a partir da musicalidade e cultura pulsantes. “Os tambores africanos são base rítmica da música no mundo. No Brasil, os atabaques do candomblé ajudaram a moldar muito de nossa musicalidade. Partindo desse entendimento, tenho buscado cada vez mais incorporar a sonoridade dos atabaques às minhas composições, mesmo em se tratando de rock e blues, que também são músicas afro-diaspóricas”, conclui Casapronta.
Lançamento do álbum “Sete” de Casapronta
Acompanhe em:
@casaprontasoueu e @casapronta7
Sobre Casapronta
Pablício Jorge, conhecido como Casapronta, é músico, cantor, compositor e Mestre em Arqueologia e Patrimônio. O artista começou a ter afinidade com a música ainda criança, quando teve contato com discos de vinil na loja que seu pai tinha em Cruz das Almas, a La Som La, primeira loja de discos e fitas da cidade. Ali entrou em contato com o universo da música, principalmente o rock n roll, quando conheceu Raul Seixas e seu disco ‘Gita”. Foi baterista, zabumbeiro e vocalista da banda de blues “Clube de Patifes” durante 25 anos.
Faixa a Faixa por Casapronta
1. Dona Maria
Canção que escrevi em homenagem à Maria Padilha, uma das mais populares pombagiras, da cultura afro-brasileira. É uma mulher à frente do seu tempo, independente, faz o que quer, como deve ser e não aceitar desaforo, nem tampouco violência contra ela. Chegar a ser temida por muitos homens. Tenho um respeito e admiração pela Maria Padilha, principalmente a que incorpora lá no terreiro. Maria Padilha é minha protetora, também. Cada música do disco tem um guitarrista convidado, e em Dona Maria, Bruno Carvalho da banda Meus Amigos Estão Velhos, um querido amigo de longas datas, veio colaborar com muita distorção na canção. Dona Maria abre o disco com força e energia.
2. Capa Preta
Outra homenagem, só que agora para o Exu Capa Preta. Essa entidade é uma das mais respeitadas no nosso terreiro de umbanda, que fica no bairro da Baraúna, em Feira de Santana. Seu Capa, como costumamos chamar, já me deu provas de sua proteção e livramento de situações difíceis. Considero o Exu Capa Preta um grande amigo, e todo ano celebramos nossa amizade e agradecimentos, com uma grande festa. Abro a canção com uma das vinhetas que extrai de festas de Zé Pilintra e do Exu Capa Preta, no terreiro que frequento, enquanto fazia as pesquisas acadêmicas na época. A canção Capa Preta veio como uma espécie de blues com muito balanço, e convidei Eric Assmar para compor as guitarras. Eric é um dos caras que carrega a bandeira do blues no Brasil, além de defender o legado do seu saudoso pai, Álvaro Assmar, em memória. Exu é blues.
3. Mandinga
Trata-se da história de um cara que relata para o Zé Pilintra, no terreiro, que haviam feito uma mandinga a fim de o amarrarem pelo coração. Foi coisa feita. Seu Zé diz que o que vale é o amor e que amor só existe se for de verdade. A mandinga para o amor pode acontecer de dar certo, mas não é para sempre. Para as guitarras, convidei Morotó Slim, um grande amigo, que sempre foi inspiração e referência pra mim, desde os The Dead Billies. Morotó conseguiu dar a canção a verdadeira cara de rock macumba. Sou honrado em tê-lo no trabalho.
4. Oferenda
Uma balada blues, que trata de um daqueles temas mais abordados pelo estilo: o sofrimento com a desilusão amorosa. “Oferenda” é uma canção antiga, que só agora pôde ser gravada. Remete à dor fazendo analogias com o periodo sofrido da escravidão dos negros no Brasil. O refrão que diz, “Não pisa na cabeça de nego, não”, faz analogia aos primeiros calçamentos do Brasil, que eram paralelepípedos em formato circular, que dificultava o andar das pessoas pelas ruas e até o pisar dos animais. Esses paralelepípedos eram chamados de “cabeça de nego”. “Não açoite o lombo desse nego, não”, é outra analogia, só quue agora com castigo em público que sofriam os negros escravizados, ditos rebeldes por discordarem ou desobedecerem seus “senhores”. “Oferenda” é uma canção cheia de simbolismos, inclusive com a passagem que diz “não despreze essa oferenda que é meu coração”. A oferenda é o agradecimento à divindade, e o coração, símbolo do amor, quando doado é uma verdadeira oferenda.
5. Matamba
Sempre quis fazer uma homenagem pra essa energia da natureza, essa energia feminina, que de certo modo me rege, também. Matamba é um Nkisi na cultura Bantu, e corresponde a Iansã na cultura Iorubá. No panteão afrobrasileiro é uma energia que está ligada às mudanças, pela força dos seus ventos e tempestades, que movem tudo do lugar, para reorganizar. Matamba é uma mãe protetora e enérgica. Convidei para compor as guitarras, um dos grandes guitarristas do Brasil, lá de Sergipe, que é o Julico da banda The Baggios. “Matamba’ é outra balada blues, e precisava de um cara que somasse com a canção, fazendo o simples e dialogando com os instrumentos, e Julico entregou tudo. Grato por ele ter vindo para essa aventura. “Matamba” tem uma vinheta de abertura captada numa festa do terreiro, quando da chegada da mesma na festa.
6. Deus é o cão
Essa é uma provocação, admito. “Deus é o cão” é uma composição de um grande amigo de Feira de Santana, de quem sempre gravo composições. Duda Brandão é o cara, Duda Brandão é rock. No interior quando alguém era destaque em alguma coisa, fazia aquilo extremamente bem, era superior aos demais, era retado, vamos dizer assim, todo mundo dizia: “É o cão”. Daí a analogia com Deus, esse ser poderoso, onipresente, onisciente e onipotente, segundo a Bíblia, né? A frase, “Quem pode mais é Deus”, é parte de um ponto cantado nos ritos de umbanda, mostrando a influência direta da cultura cristã sobre a cultura afro-brasileira, e isso não tem como ser negado. Deus é o cão, Deus é virado no “mói de coentro”, Deus é quem está pra resolver inúmeros e infinitos problemas do mundo. Só que um dia a conta pode chegar, será que Deus aguenta? Finalizo “Deus é o cão” com outra vinheta extraída de uma das festas do terreiro, cujo texto tem total ligação com a canção.
7. Reza
Essa é minha celebração. É o fechamento perfeito do disco. Termina tudo em samba, samba de roda, samba de terreiro. “Reza” foi escrita em 2016, em Cachoeira, depois de passar por um infortúnio e tê-lo resolvido. Queria uma reza que fosse minha. Acredito que cada um deva ter a sua reza, daquelas que vem de dentro, bem lá do fundo de nós, com imensa verdade. “Reza” é um agradecimento e ao mesmo tempo pedido de proteção. Três gerações do samba de roda de Cachoeira compõem o coro na música: Dona Dalva, sua filha Dona Ana; e a neta, Any. Ganhei bênçãos que foram registradas e colocadas na música. Tudo muito lindo e emocionante. Tem uma galera boa participando dessa canção, também: Geovani Gallotti na guitarra, Victor Raizeiro no cavaquinho, Clebinho de Iemanjá no vilão, Alan Cerqueira nos atabaque e Petry Lordelo no pandeiro. Viva ao Samba de Roda de Dona Dalva de Cachoeira, viva às religiões de matriz africana, viva a liberdade de você acender a vela pra quem quiser, pra Jesus ou pra Seu Zé. Viva ao S E T E.
Foto em destaque: Petry Lordelo