Prêmio Kindle: Um Prêmio para as Escritoras

Prêmio Kindle: Um Prêmio para as Escritoras

Prêmio Kindle: Um Prêmio para as Escritoras é o artigo de hoje de Michele Machado Fernandes em sua coluna semanal Conta Comigo!

No texto anterior publicado aqui na coluna Conta Comigo! (confira clicando aqui), fiz críticas à Amazon/Kindle em função do valor irrisório referente aos royalties pagos aos escritores e escritoras que cadastram seus e-books no KDP. No entanto, o sucesso da empresa é indício da oferta de vantagens ou, então, ninguém mais cadastraria seus livros lá.

 

Um dos principais atrativos é, sem dúvida, o Prêmio Kindle, evento anual que premia autores independentes ao cadastrarem seus livros em formato digital dentro de determinado período de inscrição e dentro de certos critérios. O vencedor, em geral, recebe como recompensa a publicação de um livro físico pela editora Nova Fronteira e o valor de R$50.000,00 (R$40.000,00 em dinheiro e R$10.000,00 como adiantamento de royalties da versão impressa), algo bastante chamativo em um país em que adiantamentos no setor editorial são quase nulos. Além disso, os cinco finalistas têm sua obra adaptada para audiobook.

 

Quem já ganhou o Prêmio Kindle?

O Prêmio Kindle existe, no Brasil, desde 2016 e, desde então, já foram 6 vencedores, entre os quais apenas um homem, como pode ser conferido na lista:

  • 1ª edição: Machamba, de Gisele Mirabai
  • 2ª edição: O Memorial do Desterro, de Mauro Maciel
  • 3ª edição: Dama de Paus, de Eliana Cardoso
  • 4ª edição: Dias Vazios, de Barbara Nonato
  • 5ª edição: O Pássaro Secreto, de Marília Arnaud
  • 6ª edição: A Filha Primitiva, de Vanessa Passos

 

Esse esquema rompe com a lógica normalmente apresentada na maioria dos concursos e premiações literárias, como já se analisou nesta coluna. O Prêmio Nobel, considerado a honraria máxima concedida a um escritor, não laureou mais do que 15 mulheres em mais de 100 anos de história. O Prêmio Camões, maior reconhecimento a obras publicadas em língua portuguesa, também deixa a desejar. O Jabuti, prêmio de maior destaque dentro do território nacional, ainda é um dos mais razoáveis, apesar de algumas polêmicas, como você pode ler clicando aqui.

 

Por que o prêmio Kindle se difere dos demais?

Isso ainda é algo a se pensar, mas acredito tenha algo a ver com o fato de abarcar como determinante para a disputa a quantidade de leituras efetuadas em cada e-book, suas avaliações e comentários. Embora esse critério possa ser discutido, já que atende a uma lógica comercial, traz algumas reflexões:

  • A maioria das pessoas leitoras são mulheres e, dentro de um espaço onde elas podem ler o que quiserem (fora do cânone, fora da imposição das escolas, fora do olhar do outro), elas escolhem como leitura aquilo com que mais se identificam, ou seja, as obras escritas por outras mulheres.
  • Por ser autopublicação, esses e-books não passam pelo olhar misógino das editoras, que, em geral, publicam mais obras escritas pelo gênero masculino. As escritoras têm ali, portanto, um espaço livre para expor suas produções.

Quanto à qualidade das obras premiadas, li apenas duas dessa lista e posso dizer que são ótimas escolhas para receber esse merecido destaque.

A premiada Machamba

Uma das obras lidas foi “Machamba”, de Gisele Mirabai. Essa foi uma leitura despretensiosa de um livro desconhecido para mim até então, escrito por uma autora sobre a qual eu não tinha referências.

Machamba é a protagonista, uma mulher que viaja o mundo depois de sair do interior de MG. Seria uma premissa bastante simples se não fosse um fato trágico dividir sua vida em antes e depois. A história em si é a fuga, e nos perdemos em seus pensamentos extraídos por um narrador em terceira pessoa que, muitas vezes, nos confunde com a primeira num fluxo de consciência fragmentado.

O tempo é um importante componente nesta história, pois ele é dividido em dois: o Tempo Grande, quando ela vivia a sua infância feliz na fazenda em Fiandeiras, na companhia do pai, da mãe ou do seu melhor amigo, Daniel, filho de peões; e o Tempo Pequeno, que é o tempo de depois, já adulta. Machamba tenta não se ligar a ninguém. Quando isso acontece, ela parte e tenta refazer o caminho das civilizações antigas que lia nas enciclopédias na infância. Tendo isso em vista, o tempo pode ser caracterizado como psicológico, ou seja, vai e vem conforme os pensamentos da protagonista. São pecinhas a serem encaixadas, um quebra-cabeças a ser montado peça a peça, atiçando a curiosidade e prendendo a atenção. A leitura é fluida, e a linguagem muito poética.

 

Prêmio Kindle 2022

Este ano, o Prêmio Kindle encerrou as inscrições em 28/08. Neste momento, o júri provavelmente está conferindo as avaliações dos leitores para definir aqueles que serão de fato lidos para concorrer à premiação.

Em 2022, vamos ficar na torcida para que a obra de mais mulheres seja valorizada. Podemos contribuir com isso, buscando no aplicativo as obras cadastradas para concorrer ao prêmio e efetivando a leitura. Após ler, também ajuda deixar uma avaliação, ou seja, clicar na quantidade de estrelas condizente com sua satisfação em relação à leitura e, sempre que possível, deixar um comentário por escrito. Esta última opção é a mais importante, pois também permite a outros leitores saberem informações sobre a obra a partir de alguém que já tenha lido, além de servir como parâmetro ao autor.

Eu já li três obras de peso inscritas em 2022 e, como conclusão, percebo que a disputa está sendo bem acirrada este ano. Minhas leituras foram:

  • Anatomia de um quase corpo”, de Yara Fers: traz a tentativa de superação de uma funcionária de uma fábrica que tem o seu braço amputado em um acidente de trabalho.
  • Porque éramos nós”, de Elaine Araújo Brito: conta a história de amor entre duas pessoas casadas, alternando os pontos de vista entre o homem e a mulher.
  • Eu, Inútil”, de Cibele Laurentino: mostra a vida de uma menina cuja mãe narcisista a humilha e fere sua autoestima, assim como as consequências que essas atitudes trazem para seu desenvolvimento.

Sendo assim, voltarei a falar do Prêmio Kindle em breve nesta coluna e, assim, explorar muito essas obras intensas, que, por meio do olhar feminino, denunciam problemáticas comuns a muitas de nós.

2 thoughts on “Prêmio Kindle: Um Prêmio para as Escritoras

  1. @elaine.escritora says:

    Michele Fernandes, sempre incansável em seu apoio à literatura feita por mulheres no Brasil. Obrigada pelo texto esclarecedor e, claro, pela leitura carinhosa do meu livro!

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